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Mensagens

A mostrar mensagens de fevereiro, 2008

PSD e políticas avulsas

O líder do PSD, Luís Filipe Menezes, foi genericamente acusado de apresentar medidas avulsas e inconsequentes. Vieram essas críticas a propósito da entrevista que o líder do PSD deu à SIC Notícias, em que explanou a sua proposta para retirar a publicidade à RTP. É curioso verificar que muitas das críticas a essa proposta vieram do interior do próprio PSD. De facto, é impossível não verificar que o líder do PSD é afoito quando apresenta propostas ao país, mas as suas propostas perdem substância, consequência da sua incapacidade de fazer um enquadramento geral das suas políticas; na verdade, tem faltado muito ao PSD no sentido de fazer uma oposição credível ao Governo, e Luís Filipe Menezes, coadjuvado por Santana Lopes, têm-se desdobrado em enunciações de políticas avulsas, e rapidamente descartáveis. Primeiro foi a tirada da Constituição, mas nem se explicou o caminho nem o porquê de se pretender mexer na Constituição, depois foi a ideia do partido-empresa, e agora as alterações, ao ní

Conflito israelo-palestiniano e radicalismos

Quando se fala em Médio Oriente, acaba-se invariavelmente por referir o conflito israelo-palestiniano, e quando assim é, não raras vezes insiste-se na radicalização de posições – ou se entende incondicionalmente o lado palestiniano ou se faz o mesmo com as razões israelitas. Esta é, claramente, uma questão complexa e que acarreta dificuldades nas possíveis soluções para o infindável conflito que parece separar indelevelmente israelitas e palestinianos. É possível compreender os argumentos de uns e de outros, porém, não se pode aceitar, que para se atingir um determinado fim, se recorra ao terrorismo. Essa deverá sempre ser uma posição inexpugnável. Se por um lado compreendemos a urgência de um Estado palestiniano, e um regresso às fronteiras de 1967; por outro, não se pode ignorar os constantes ataques terroristas de que o povo judaico é alvo, e mais: a intransigência de grupos palestinianos, como é o caso do Hamas, em aceitar a existência de um Estado israelita é um óbice à paz. Não s

Política de baixo nível

O país vive um período de dificuldades – e não, não são apenas de natureza económica –, agora foi a vez do ministro da Agricultura nos presentear com um momento degradante. De facto, os ministros deste Governo não cessam de nos surpreender com as suas alarvidades, e quando pensávamos que o campeão seria o ministro das Obras Públicas, segue-se então o ministro do Ambiente e surge-se agora o zénite da alarvidade com as declarações ignominiosas do ministro da Agricultura. O infeliz episódio surge depois do Presidente do CDS-PP ter questionado o ministro da Agricultura sobre políticas do seu ministério e de ter acusado o ministro de “praticar uma política de calote” por não pagar aos agricultores. O ministro decidiu então não responder às afirmações de Paulo Portas, e enveredou por um caminho das denúncias e de insinuações, tendo ainda tempo para fazer um trocadilho com a palavra “branqueamento”. Ora, em primeiro lugar, o caso do Casino de Lisboa, o caso Portucale devem ser alvo de esclare

Comunicação social incómoda

As reacções à notícia do PÚBLICO que dá conta de inconsistências durante um período em que o primeiro-ministro desempenhou funções de engenheiro técnico, são sintomáticas da existência de uma classe política pouco habituada ao escrutínio público e que tenta alimentar teorias da conspiração sempre que tem dificuldades em esclarecer o teor das notícias. De facto, os tempos não têm sido fáceis para o Governo e para o PS – a contestação relativamente às políticas do SNS e a consequente remodelação governamental, o desemprego que não dá sinais de baixar significativamente, e a existência de um descontentamento mais ou menos latente do chamado país real, já para não falar da única verdadeira oposição às políticas do Governo e que Manuel Alegre tem protagonizado, aparecem como ameaças a um Governo aparentemente inabalável. Imagine-se então o primeiro-ministro com tantas dores de cabeça ter ainda de lidar com notícias de jornais que escrutinam a sua vida profissional. O resultado: um aumento d

As fragilidades da União Europeia

A crise que eclodiu da declaração de independência unilateral do Kosovo vem pôr em evidência as fragilidades de uma União Europeia que raras vezes consegue manter a unanimidade em torno de uma questão que acaba por ser, em larga medida, determinada pelos Estados Unidos. A existência de uma unidade política anódina, em particular nos assuntos externos, que se pretende fortalecer com a criação do cargo de um alto representante para os negócios estrangeiros – medida que contemplada pelo Tratado Reformado – é uma evidência grave. A problemática dos Balcãs é só mais um exemplo de divisões mais ou menos latentes no seio da UE, consequência óbvia da inexistência de unidade política, já para não falar da insipiência militar da UE. Para além das questões externas a procura de uma maior homogeneização política verdadeiramente consolidada é fundamental para fazer da UE uma verdadeira potência económica que servirá de exemplo, em matéria de políticas económicas e sociais, para o resto do mundo que

Ainda a independência do Kosovo

As consequências da independência do Kosovo não se fizeram esperar. Os ataques, perpetrados por cidadãos sérvios, às embaixadas de países que reconheceram a independência desta província da Sérvia são apenas a parte mais visível do problema que se gerou. A instabilidade na zona dos Balcãs, parece uma inevitabilidade. Ao descontentamento dos sérvios, junta-se o forte apoio da Rússia que avisou não descartar a possibilidade de recorrer à força se assim for necessário, visto que existiu um claro atropelo às leis internacionais. A União Europeia, embora seja encetados esforços no sentido de parecer unida, não consegue esconder as divisões internas sobre esta matéria. Além disso, a União Europeia usa e abusa da possível adesão da Sérvia à UE como forma de atenuar a exasperação sérvia. Neste contexto, as consequências da declaração unilateral do Kosovo são assinaláveis, porém, a possibilidade de virem a surgir consequências mais gravosas, não é, de todo, de excluir. Não se exclui por complet

Relatório da Sedes

O relatório da Sedes (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) veio constatar o óbvio: existe na sociedade portuguesa um “mal-estar profundo e difuso” e que pode degenerar numa crise social de consequências imprevisíveis. Ora, já há muito que os cidadãos se aperceberam do descontentamento que grassa no país, e já o perceberam porque vivem diariamente dificuldades que lhes impossibilita viverem outros estados de alma. O Presidente da República fala novamente de trabalho como sendo a panaceia para todos os problemas. Mas a verdade é que são os portugueses que trabalham que tem vindo a suportar os custos da crise que insiste em não abandonar o país, e são os portugueses que trabalham que não vêem os seus salários crescerem, e em sentido inverso, assistem a um incomportável aumento do custo de vida num país cuja carga fiscal é onerosa, num contexto de endividamento de empresas e famílias. Não havendo panaceias, o trabalho dos portugueses está muito longe de ser a grande soluçã

O país real

A crítica mais frequente à entrevista que o primeiro-ministro deu à SIC prende-se precisamente com o desfasamento entre o discurso de José Sócrates e o país real. Paralelamente, José Sócrates foi elogiado por ter um conhecimento das pastas e por responder inequivocamente às perguntas que lhe eram colocadas. No cômputo geral, a entrevista foi feita à medida do primeiro-ministro que despejou números e escamoteou realidades. É lógico que não há um país real, há vários países reais, o que significa que existem várias realidades distintas no país. Na entrevista da SIC, o primeiro-ministro conseguiu a proeza de discutir um país muito longe da realidade que cada português conhece. Quando se discute o desemprego com a ligeireza com que o primeiro-ministro emprega no seu discurso, e quando não se percebe que duas décimas de baixa da taxa de desemprego, não diz rigorosamente nada a quem vive nessa difícil situação, está-se a fugir a uma realidade. Por outro lado, nem uma palavra do primeiro-mini

Eleições no Paquistão

Os resultados das eleições no Paquistão mostraram claramente que os paquistaneses não estão com o Presidente Musharraf. Aliás, as exigências para que o Presidente renuncie ao cargo têm subido de tom. O PPP (Partido do Povo do Paquistão) de Benazir Bhutto e o Partido da Liga Muçulmana de Sharif, também ex-primeiro-ministro, foram os grandes vencedores destas eleições. A possibilidade de coligação dos dois partidos, não obstante as nítidas divergências, parece ser muito provável. Até porque essa é uma das ilações a retirar dos resultados eleitorais – o povo paquistanês quer uma governação destes partidos contra Musharraf. O Presidente Musharraf tem estado debaixo de fogo por várias razões: por um lado, a estreita relação com EUA na luta contra o terrorismo desagradou a muitos paquistaneses; por outro lado, as questões internas, designadamente a imposição de um estado de emergência, a prisão domiciliária de juízes do supremo tribunal, as alterações na Constituição levadas a cabo por Musha

A polémica avaliação dos professores

A avaliação dos professores proposta, ou melhor imposta, pelo Executivo de José Sócrates tem provocado um aumento da insatisfação por parte da classe docente. Antes de mais, importa sublinhar a importância de um modelo de avaliação dos professores, e parece evidente que sobre a questão da avaliação, os próprios professores não se opõem. Mas também importa discernir sobre que modelo de avaliação é mais profícuo, e este, proposto pelo Governo, em muitos aspectos, não o é. Por um lado, não se percebe a proficuidade de uma avaliação que contemple as notas dos alunos, ou dito de outro modo, uma avaliação consoante as notas dos alunos. Parece evidente que muitas incongruências e injustiças vão surgir desde tipo de avaliação. E mais, não haverá o risco de estar a criar as condições necessárias para que os professores, em benefício próprio, atribuam notas desfasadas da realidade? Por outro lado, onde está a sensatez de se pretender aplicar um modelo desta natureza a meio do ano lectivo? E será

Cuba: transição para a democracia?

A pergunta em epígrafe impõe-se no dia em que Fidel Castro anunciou a renúncia ao poder em Cuba. Hoje foi anunciado o fim de um ditador, mas dificilmente se poderá anunciar o fim do regime. Todavia, o regime sofrerá, inevitavelmente, mudanças, até porque não se pode dissociar o regime do próprio Fidel. Seja como for, hoje é um dia de esperança para muitos cubanos, e talvez ainda mais para aqueles que sofreram as sevícias do regime e os que se viram obrigados ao exílio. Historicamente, Cuba sempre degenerou em regimes mais ou menos repressivos. Antes de Fidel, já Batista tinha imposto um regime repressivo, e não obstante o progresso económico, a pobreza alastrava-se. Depois da chegada ao poder, Fidel Castro, impõe um sistema repressivo que obriga muitos milhares de Cubanos ao exílio; a repressão a sindicatos, o encerramento de colégios religiosos, a prisão de intelectuais, as vagas de prisões políticas, a clandestinidade, os campos de concentração e os fuzilamentos marcam o regime de Fi

A descrença na classe política

Hoje vivemos um momento de evidente pobreza do cenário político português, sobretudo dos principais intervenientes políticos. Todo o espectro político deixa dúvidas à generalidade dos cidadãos, e muitos não têm qualquer tipo de esperança de ver estes políticos mudarem o país. A descrença na política e nos políticos alastra-se e agrava-se de dia para dia. Essa descrença mina a qualidade da democracia, mas diga-se em abono da verdade que a classe política tem perdido a pouca credibilidade que tinha, o que justifica e explica um afastamento entre cidadãos e políticos. De um modo geral, são muitas as críticas ao Governo, que recrudesceram nas últimas semanas. É notório o nervosismo que atravessa o líder do PS, e primeiro-ministro de Portugal, mas que também contaminou o resto da militância do PS, incluindo algumas figuras respeitadas no seio do PS. As declarações de António Costa a uma rádio, só podem ser justificadas por esse nervosismo – causado por uma conjuntura, que inclui o desconten

Chegou o dia da independência

Chegou o dia da independência para o Kosovo que declarou unilateralmente a sua independência. A comunidade internacional, grande parte, reconhece a inevitabilidade deste processo, mas ninguém consegue esconder o elevado grau de desconforto que esta independência desencadeia. O Kosovo de maioria albanesa – perto de 90 por cento da população – que desde o tempo de Tito tinha alguma autonomia, viveu uma guerra que eclodiu com o nacionalismo exacerbado sérvio de Milosevic. Mas até que ponto esta ânsia kosovar de declarar a sua independência é indissociável do sonho, acalentado por muitos, da grande Albânia? De qualquer modo, o reconhecimento deste novo Estado será mais ou menos genérico. Exceptuando a Rússia, e naturalmente a Sérvia, a generalidade dos países acabarão por reconhecer a independência do Kosovo – com maior ou menor desconforto. Outra questão será perceber até que ponto esta secessão poderá legitimar outros movimentos que, um pouco por toda a Europa, almejam a secessão. Este é

Ginásios e IVA

Surgem várias notícias que veiculam o alegado não cumprimento, por parte dos ginásios, da redução do IVA. Já aqui se defendeu a tese de que esta redução do IVA não seria uma prioridade, quando se verifica que muitos portugueses têm outras necessidades mais prementes. E num contexto de incessável crise, é anedótico que o Governo encare os ginásios como sendo uma prioridade. De qualquer modo, o cumprimento do que foi estipulado não tem sido a política de muitos ginásios, e não obstante o ridículo da medida – quando enquadrada na difícil situação que assola o país –, a gula de muitos empresários é absolutamente inaceitável. Aparentemente, os ginásios recorrerem a todo o tipo de subterfúgios para não cumprirem lei, com vista a aumentar a sua margem de lucro. O secretário de Estado do Desporto fala em “cartelização”. Ora, a fuga ao cumprimento do que está estipulado é sintomático da existência um tecido empresarial que não respeita ninguém, e, se for necessário, em nome do lucro, não se res

As caricaturas da polémica

As caricaturas retratando o profeta Maomé, que há dois anos provocaram reacções do mundo islâmico, voltaram a ser publicadas em alguns jornais dinamarqueses. A publicação das polémicas caricaturas surge depois se conhecer um plano para assassinar um dos caricaturistas. Há dois anos discutia-se vivamente a fronteira entre o respeito por uma religião e a liberdade de expressão que caracteriza indelevelmente os países democráticos. Desde logo, importa fazer referência à importância da liberdade de expressão que, mais do que ser característica dos países democráticos, é elemento indissociável do modo de vida ocidental, e quando posta em causa, origina reacções tempestuosas. Não seria de esperar outra coisa que não fosse a defesa veemente da liberdade de expressão por parte de quem faz uso dela diariamente e sente gratificação de viver num contexto onde essas liberdades efectivamente existem. Não é de estranhar, portanto, que alguns jornais dinamarqueses fizessem valer a sua posição de defe

O essencial fica por fazer

O Governo virou a página das reformas, e passou para o capítulo dos subsídios acompanhados pela indispensável propaganda. Assim, fica o essencial por fazer, adiando-se o futuro do país, e condenando os portugueses à eterna condição de remediados, quando não mesmo de pobres. O Governo pode ter a pretensão de ter sido reformista, mas essa pretensão cai em saco roto quando se avalia a questão com maior minúcia. Com efeito, o Executivo de José Sócrates foi bem sucedido no que toca à sustentabilidade em matéria de segurança social, as reformas do Governo neste particular permitem olhar para o problema da sustentabilidade com outros olhos. Nem podemos subtrair ao actual Executivo o sucesso da redução do défice, embora os números mágicos só tenham sido conseguidos com recurso a um aumento exponencial da receita, ou dito de outro modo, com recurso a um aumento de impostos. Mas a verdade é que muito ficou por fazer. Isto é tanto mais verdade quando se verifica o anúncio recorrente de políticas

Sindicalismo e novas realidades

Um dos mais notórios desequilíbrios do neoliberalismo é precisamente entre a força dos mercados e a fraqueza dos trabalhadores. A união de esforços de grandes multinacionais, a perda de instrumentos dos governos, a ausência de regulação das instâncias supranacionais e a ideia generalizada que o mercado toma conta de si próprio são características dos dias que vivemos. Os trabalhadores, em sentido inverso, têm dificuldades acrescidas em fazer valer os seus direitos, sendo bastante claro que esses direitos sofrem atropelos diários. É com este pano de fundo que os sindicatos são de uma importância crucial para o regresso a um equilíbrio. Infelizmente, esse equilíbrio não tem sido conseguido, em larga medida porque existe uma tendência genérica para se desvalorizar o sindicalismo e para considerá-lo anacrónico e desfasado da realidade. Mais razões existem, portanto, para os sindicatos se regenerarem, encontrarem novas formas de luta, que sejam mais abrangentes, mais autónomos de partidos p

Agitação em Timor-Leste

O atentado contra as vidas do Presidente timorense, José Ramos-Horta, e do primeiro-ministro, Xanana Gusmão, deixam mais dúvidas do que certezas. Terá sido a tentativa de um golpe de Estado? Por que razão os alvos foram Xanana Gusmão e Ramos-Horta, quando estes sempre tentaram dialogar com o major Reinado? Como é que se explica a facilidade com que os ataques foram perpetrados? Regista-se, para já, a morte do major Alfredo Reinado. Os últimos dois anos têm sido particularmente difíceis para este jovem Estado independente. Recorde-se que Xanana Gusmão e José Ramos-Horta sempre enveredaram por uma via pacífica para chegarem à independência do território. Contudo, em 2006 eclodem revoltas no seio dos militares que se queixam de discriminação, esta crise de 2006 está longe de ter sido atenuada, e a instabilidade continua a vigorar no território. Ainda não há uma verdadeira coesão nacional, surgindo frequentemente a insatisfação de militares e das forças policiais. No caso concreto, há que

O multiculturalismo de Rowan Williams

As declarações sobre a sharia (lei islâmica) proferidas pelo arcebispo de Cantuária provocaram grande celeuma no Reino Unido. Em síntese, o líder da igreja Anglicana defendeu a tese da inevitabilidade da sharia ser incorporada na lei britânica. Segundo esta visão multiculturalista do arcebispo, é inevitável que os muçulmanos que vivem no Reino Unido tenham a possibilidade de escolher entre a lei dos britânicos e sua própria lei. Mesmo que o arcebispo tenha defendido esta tese com base numa versão moderada da sharia, a ideia, só por si, é uma aberração. As leis dos países aplicam-se a todos os cidadãos desses mesmos países, não faz qualquer sentido reivindicar diferenças com base em aspectos culturais ou religiosos. Se tal fosse possível, outros grupos poderiam reivindicar o direito a terem uma lei que se aplicasse exclusivamente a esses grupos, fossem eles religiosos ou não. As especificidades religiosas ou culturais têm de se coadunar com o sistema jurídico em vigor. Rowan Williams, o

O atoleiro

O atoleiro que dá título a este texto é o Iraque, ou mais concretamente a difícil situação do Iraque remete-nos para a imagem de um atoleiro. Esta designação não é nova, mas não deixa de ser inquietante, anos depois da intervenção militar americana no Iraque, verificar-se que a situação não melhorou, e que o Iraque continua a ser o já referido atoleiro. Mais do que as discussões geopolíticas, o que é, de facto, importante não esquecer é a difícil situação do povo iraquiano apanhado no meio de uma incessante animosidade entre xiitas, sunitas e curdos, e vítimas dos intermináveis ataques terroristas levados a cabo por grupos extremistas, com ligação ou influência da Al-Qaeda. Com efeito, muitos iraquianos, amiúde os mais capazes e com maior formação, abandonaram o país, deixando desta forma um vazio difícil de preencher e contribuindo, involuntariamente, para um adiamento do futuro deste país. Aqueles a quem não lhes foi permitido esse êxodo, continua a tentar sobreviver num país em que,

Os males do costume

É frequente pensarmos sobre o estado do país, o seu atraso, a sua eterna relutância em encontrar o caminho do desenvolvimento, e não raras vezes questionamos sobre o que nos torna tão diferentes dos restantes povos europeus. As comparações entre a qualidade de vida dos cidadãos portugueses e dos cidadãos de outros Estados-membros são invariavelmente motivo de conversa. A resposta não é simples. Contudo, é possível fazer um exercício de enumeração sobre o que está errado no nosso país, mesmo que essa enumeração não deixe de ser redutora. O Estado, desde logo, não permite que o país possa, rapidamente, inverter a situação que se tem agravado nos últimos anos. O primeiro passo passa inelutavelmente por responder à seguinte pergunta: que estado queremos? O Estado, para além de comportar as características nefastas conhecidas por todos – a sua dimensão e ineficácia –, acaba por redundar num óbice ao desenvolvimento. No essencial, o Estado é um ávido consumidor de recursos que, se fossem cer

Tempos difíceis para a justiça

A justiça em Portugal tem características marcadamente negativas, mas nos últimos tempos tem vivido momentos mais conturbados. Depois de uma difícil aceitação das alterações do código de processo penal que, entre outras coisas, foi de rápida implementação e permitiu que pessoas acusadas de crimes graves tivessem um acesso inexplicável à liberdade, surgiram as duras críticas do bastonário da Ordem dos Advogados, secundado, de certa maneira, embora com um estilo menos inflamado, pelo Presidente da República. Foi agora a vez do director da Polícia Judiciária pronunciar-se a sobre um processo extraordinariamente mediático, cometendo a imprudência de colocar dúvidas sobre o estatuto de arguido do famigerado casal britânico. É certo que é genericamente reconhecido que a justiça em Portugal funciona mal – quando funciona –, é lenta, é intrincada, e, não raras vezes, é pouco equitativa. Mas a forma como o ministro da Justiça encarou as declarações do director da PJ, é, no mínimo preocupante –

Eleições na América

O mundo anda de olhos postos nos Estados unidos, não que isso seja propriamente uma novidade, mas o facto é que é as eleições primárias dos partidos Republicano e Democrata são o centro das atenções internacionais. Ontem mesmo foi a super Tuesday com dezenas de estados americanos a escolherem os seus candidatos. As eleições no partido Democrata têm a particularidade de serem disputadas entre uma mulher e um afro-americano, o que por si só, justifica a mediatização destas eleições. A verdade, porém, é que os americanos parecem ansiosos por escolher um novo presidente, o que representará um novo começo para os EUA. A herança de Bush é muito negativa, tanto no plano interno, como no plano internacional. E não se trata apenas da saturação que os americanos sentem relativamente à guerra no Iraque; também na economia a actuação do Presidente Bush foi desastrosa – optando mesmo por cortar nas políticas sociais com o objectivo de tapar o buraco criado pelas despesas da guerra. O candidato rep

Pessimismo na educação

O pessimismo caracteriza amiúde as discussões e percepções sobre a educação em Portugal. Compreensivelmente, muitos actores educativos sentem um misto de frustração e pessimismo. Deste modo, impõe-se uma forte crítica à actual ministra da Educação que mais não fez do que acentuar essas percepções nefastas sobre a educação, em particular, quando levou a cabo acções e uma retórica carregadas de animosidade relativamente à classe docente. Mas o pessimismo sobre o futuro da educação não é de agora, muito pelo contrário, desde há muito tempo esse pessimismo é intrínseco à educação. Evocar-se-ão vários factores que subjazem a uma ausência generalizada de esperança – a falta de condições nas escolas, a pouco autonomia das mesmas, as querelas entre sindicatos que representam professores e o ministério, o desânimo de pais, alunos e professores. Mas a realidade é que é essencial, por um lado, combater o conservadorismo que impera nas políticas educativas e, naturalmente, na própria escola; e por

Corrupção

Paradoxalmente, a corrupção é uma realidade indesmentível do nosso país, mas continua a ser uma palavra onerosa, e, quando pronunciada em público, surgem invariavelmente uma quantidade assustadora de virgens ofendidas. Passou-se precisamente isso quando o recém-eleito bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, foi veemente nas críticas que fez à forma como a corrupção grassa em Portugal. Surgiram imediatamente vozes a criticar o bastonário, criticas essas fundamentadas no pressuposto que não se pode fazer denúncias sem provas. Essa premissa tem como objectivo desvalorizar as críticas certeiras do bastonário, até porque causaram incómodo a muitos que, de uma forma ou de outra, perpetuam a promiscuidade, o caciquismo, o favor ao amigo, e, em última instância, formas mais graves de corrupção. As várias formas de corrupção que assolam o país dos brandos costumes encontram no Estado o terreno fértil para proliferarem. Quando existe demasiada dependência dos cidadãos e das empresas co

Esmorecimento do ímpeto reformista

O ímpeto reformista, característica marcante do actual Executivo, parece ter esmorecido. E não se trata apenas de uma ilação a retirar da mini-remodelação levada a cabo pelo primeiro-ministro – tendo em conta as reformas desenvolvidas pelo cessante ministro da Saúde. Mas a verdade é que esse ímpeto esmoreceu prematuramente. O país precisa de reformas, dificilmente se pode refutar essa necessidade. Podemos advogar formas de se encetar essas reformas, mas a necessidade de se reformar áreas estruturais do país é insofismável. Dir-me-ão que muitas reformas foram tentadas no passado com os resultados conhecidos. Ora, a inevitabilidade de reformas não pode ser contrariada pelos falhanços do passado. O funcionamento do Estado e a incontornável reforma da administração pública está longe de ser uma prioridade deste Governo. Inicialmente o ímpeto reformista do Executivo de José Sócrates passava pela reforma da Administração Pública, mas a determinação do primeiro-ministro acabou por se revelar

Com os olhos postos nas legislativas

A estratégia de governação do primeiro-ministro tem vindo a sofrer significativas alterações. Este mandato começou com a imagem de um Governo determinado, frequentemente irascível, mas caracterizado pelo famigerado ímpeto reformista. Depois da forte contestação popular contra o encerramento de centros de saúde e urgências hospitalares, o primeiro-ministro decidiu mudar de ministro da Saúde. Essa mudança era, de certa forma, inevitável, mas também é o resultado da aproximação das eleições legislativas de 2009. Não seria expectável que o primeiro-ministro procedesse a uma remodelação na área da Saúde se não fosse a aproximação de novas eleições. De facto, o que se verificou é que o ministro da Saúde se tinha tornado politicamente insustentável, e que a sua permanência poderia ter custos elevados para o futuro do primeiro-ministro. Consequentemente, a saída deste ministro tem como objectivo refrescar o ministério e convencer as pessoas de que as políticas do Governo para a Saúde são essen