Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

A mostrar mensagens de outubro, 2018

Os tempos do homem-massa

No anos trinta do século passado Ortega y Gasset alertou para os perigos da sociedade de massas e para o homem-massa e começou por chamar a atenção para o paradoxo do homem-massa rejeitar a oportunidade única de viver plenamente em tempos livres da tirania, marcados pelas promessas da tecnologia e pela democratização da política, com realidades até então pouco consolidadas como a liberdade. O filósofo espanhol caracteriza o homem-massa da altura como sendo alguém que rejeita os valores intelectuais e espirituais, recusa a verdade, abraçando o egocentrismo e o materialismo; o homem-massa rejeita a opinião do outro e tem aversão a qualquer coisa remotamente semelhante ao espírito crítico; conforma-se; o homem-massa não tem particular predilecção pelo belo ou até pela cultura; rejeita a diferença e ele próprio não aceita ser diferente das massas; subjuga-se, no tempo de Ortega y Gasset à comunicação social, hoje também e sobretudo às redes sociais; o homem-massa não pensa

O que mais assusta

O que mais assusta não é o novo presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, desde logo porque o mundo está pejado de imbecis de má índole. O que mais assusta é a quantidade de cidadãos dispostos a deitar para o lixo a democracia e os direitos humanos em nome de segurança, estabilidade, moralidade, regresso ao passado (qual passado? Não interessa), ou coisa semelhante. Banha da cobra comprada por demasiada gente. O que mais assusta é a quantidade incomensurável de pessoas dispostas a deitar para o lixo a democracia como forma de protestar contra o PT e contra Lula, indiferentes à intoxicação primeiro levada a cabo pela comunicação social, depois desencadeada por forças sinistras e poderosas que instrumentalizaram as redes sociais O que mais assusta é a quantidade surpreendente de eleitores capazes de deitarem para o ralo a democracia e a defesa do ser humano em troca de falsas promessas, levemente abençoadas por um Deus que, a assistir a tanta triste figura, não quereria ter nada a ver

Eleições no Brasil: um especial agradecimento à comunicação social

Refém dos grandes interesses económicos se que estão nas tintas para o regime político, desde que seja lucrativo, a comunicação social brasileira foi peça essencial para o desfecho das eleições do passado domingo. Apostada em eliminar o PT e indiferente ao perigoso vazio que estava a criar, assistiu já mais enfraquecida ao ressurgimento de um déspota boçal que ganhava terreno a cada dia que passava. O déspota não precisou de muita inteligência, apenas deixou que o vazio criado por essa comunicação social acabasse ocupado pelas redes sociais entretanto tomadas pela peste das notícias falsas, pelo sectarismo e pelo. O que não quer dizer que o PT não errou e de forma clamorosa; o que não quer dizer que o PT não sucumbiu à corrupção endémica; o que não quer dizer, sobretudo, que o PT se encontre sozinho a calcorrear caminhos onde impera a total ausência de ética. O PT, contrariamente ao que foi propalado pela comunicação social, está bem acompanhado no que diz respeito à corrupç

Quando se semeia ódio

O sectarismo e a bipolarização envoltas num ódio deliberadamente espalhados por responsáveis políticos não pode ter quaisquer outras consequências que não as mais nefastas. As bombas enviadas por correio para figuras próximas do Partido Democrata, incluindo Barack Obama e Hillary Clinton dificilmente escaparão a uma análise assente exactamente nessa premissa de que o sectarismo e o ódios espalhados por responsáveis políticos redundam na pior das acções. Donald Trump chegou à presidência americana promovendo esse sectarismo. Curiosamente Trump acusou a CNN de divulgar notícias falsas, chegando ao ponto de colocar um vídeo online onde socava alguém cujo rosto era o símbolo da CNN. Curiosamente o inefável Presidente americano fez campanha afirmando que Obama não era americano e que Clinton era uma criminosa que devia estar presa. Trump, quebrando décadas de convivência saudável entre candidato à presidência e depois Presidente e o partido da oposição, exultou. à semelhança

As quintas-feiras de Cavaco Silva

As quintas-feiras e restantes dias dos anos de presidência de Cavaco Silva foram marcadas, como se percebe até pelos livros de sua autoria, pela mais inexorável inexistência de autocrítica. Todos erraram, uns aparentemente de forma mais artística do que outros, excepto, obviamente, ele próprio. Paralelamente a essa ausência de espírito de auto-crítica, Cavaco presta-se à triste figura de revelar conversas com terceiros, tidas como conversas de Estado e, por inerência, privadas. Ao invés, o ex-Presidente preferiu revelá-las sem qualquer espécie de pudor, acrescentando as suas considerações sobre as conversas e sobre os interlocutores. O segundo volume das "Quintas-feiras e Outros Dias" de Cavaco Silva mais não são do que mais um exercício próprio de um ressabiado que não quer ou não está preparado para ser esquecido; um exercício próprio de quem se tornou absolutamente irrelevante, apenas reconhecido pelo seu espírito tomado pela ignomínia. Na verdade, as qui

Sectarismo

O sectarismo está a tomar conta da política em vários países, alguns dos quais constituem uma verdadeira surpresa, como o caso dos EUA. E é graças também a esse sectarismo que Donald Trump chegou à presidência. O sectarismo traduz-se no espírito de intolerância com partidos divididos por "raças", religião e situação sócio-económica. Paralelamente cresce a ideia, junto daqueles mais próximos do partido Republicano, que os brancos, cristãos, estão a perder força no tabuleiro político, forçando-os a uma reacção de apoio àqueles que propõe medidas, por muito obtusas que sejam, para mitigar ou reverter o actual estado de coisas. Um pouco na senda da famigerada frase "make America great again". Em contrapartida, o partido democrata é visto como agregador de minorias, cada vez menos minoritárias. De resto, a presidência de Obama veio agravar esse sentimento de perda de importância e transferência de poder para as chamadas "minorias" não brancas e n

Um aliado de peso: as notícias falsas

Jair Messias Bolsonaro, bem colocado para vencer as eleições brasileiras, contou com um aliado de peso: as notícias falsas veiculadas pelas redes sociais, onde a vitimização e as teorias da conspiração fazem escola. Mais: segundo uma investigação do jornal Folha de São Paulo, várias empresas privadas, naturalmente apoiantes de Bolsonaro, pagaram a empresas de marketing para despejarem centenas de milhões de mensagens com propaganda anti-PT. O Whatsapp terá sido o veículo escolhido. Recorde-se que as empresas privadas não podem, à luz da lei brasileira, financiar candidatos políticos. Outro dado importante diz-nos que são os apoiantes de Bolsonaro são os que mais se informam via Whatsapp e 91 por cento dos brasileiros, em 2016 – ano do impeachment de Dilma – declarava informar-se pela internet, com 72 por cento a escolherem o Whatsapp ou o Facebook. E ainda recentemente um conjunto de investigadores brasileiros juntamente com uma agência de verificação de factos, chegou à conclusão

Um Orçamento sem oposição

O país já conhece o Orçamento de Estado 2018 e a oposição ainda não decidiu exactamente para que lado se virar. Todos repetem o mesmo: "orçamento eleitoralista" e obtusidades como aquela que postula que o OE 2018 faz lembrar os orçamentos do tempo de José Sócrates, não se percebendo exactamente se se referem ao período de tempo subsequente à crise de 2008 e em que a política europeia foi expansionista durante perto de um ano ou a outro período. Enfim, de qualquer modo for a comparação é absurda, não merecendo sequer qualquer comentário alongado. O Governo de António Costa, que contou mais ou menos com a participação dos parceiros desta solução, elaborou um documento que vem na linha dos anteriores: alguma, mas parca, reposição de rendimentos, designadamente com aumentos nas pensões e salários, mitigação da precariedade, muito longe ainda assim do que seria necessário, e algumas operações de cosmética que dão a impressão de investimento em áreas como a Saúde e

Tempo de união

Restam cada vez menos dúvidas: apenas a união daqueles que defendem a democracia pode impedir a ascensão ao poder de um fascista no Brasil e no regresso à ditadura. Apenas uma grande frente contra Bolsonaro poderá evitar uma verdadeira tragédia para o Brasil. Haverá quem ainda considere estas palavras exageradas e distantes da realidade, exactamente na mesma linha de tantos outros há largas décadas atrás na Europa e depois na América do Sul. Não há nada de exagerado nestas palavras e se sentimos a necessidade de as corrigir é porque as mesmas pecam por não descrever, com necessário rigor, o que está na calha. Todavia, a incapacidade do neoliberalismo continuar a fornecer ilusões para esconder a realidade, a subsequente morte da esperança, o desencanto com as soluções oferecidas pelos políticos, o cristianismo evangélico que conta com a ignorância e com a miséria para aumentar o seu poder e regressar à idade das trevas , a corrupção endémica, mas apenas atribuída a um dos

Passos Coelho: uma oportunidade perdida

Numa altura em que se exige que os democratas se insurjam contra as diferentes ameaças autoritárias, torna-se ainda mais evidente a importância de algumas palavras e de alguns gestos como a manutenção do apoio de Pedro Passos Coelho à candidatura à Câmara de Loures de André Ventura. Recorde-se que o inefável candidato pelo PSD à edilidade apostava num discurso racista contra um grupo étnico. Consequentemente, e nessa altura, tornou-se claro que Ventura era um populista em potência, para não dizer mais e ainda assim Pedro Passos Coelho manteve o seu apoio, pese embora o CDS, por exemplo, o tenha retirado. Ora, uma das formas dos democratas combaterem a ameaça autoritária, venha ela sob a forma de um populismo aparentemente inócuo ou sob a forma de fascismo mais difícil de disfarçar, é precisamente retirar toda e qualquer forma de apoio. De resto, Mussolini e Hitler contaram com o apoio de políticos ou partidos seus contemporâneos, com os resultados conhecidos. Por con

A morte das democracias

A democracia, o tal sistema a que nos habituámos, de tal maneira que nos esquecemos de lutar por ele, está em perigo de morrer e até em países europeus como a Hungria essa morte já foi consumada. Em tempos, as democracias morriam às mãos de golpes militares ou outros golpes de Estado, agora são os próprios cidadãos, através do seu voto, a viabilizar a escolha do autoritarismo que, no melhor dos casos, enfraquecerá o sistema democrático e, no pior, acabará por matar a própria democracia. A democracia morre assim às mãos de cidadãos descontentes e/ou desinteressados, executada por ditadores que usam caminhos democráticos a seu favor, transformando-os, dando-lhe o tão necessário cariz autoritário. Dissociar a evolução do capitalismo desta deriva autoritária pode ser um exercício precipitado. De resto, o capitalismo selvagem pejado de especulação, pai das desigualdades, movido exclusivamente pelo aumento do lucro e convenientemente disfarçado pela tecnologia e pelos seus encantos

Chega

André Ventura, vereador do PSD na Câmara de Loures, conhecido pelo seu discurso inflamado contra a comunidade cigana, vai renunciar ao mandato para criar um partido político, um tal de "Chega". Ora, aproveitando os ares dos tempos, Ventura prepara-se assim para evitar uma nova maioria de esquerda, propondo a proibição constitucional da eutanásia, a castração química de pedófilos, o regresso da prisão perpétua ou a proibição do casamento entre pessoas do mesmo sexo.  A ascensão do fascismo e o sucesso de alguns movimentos ou figuras políticas dessa natureza dá força a quem recentemente procurou assaltar o poder no PSD e, perante o insucesso, resolve aproveitar o espírito dos tempos em que o fascismo voltou a ser opção para apresentar um novo partido que acabará, mais cedo ou mais tarde, de se aproximar desses ditos movimentos. E não vale a pena desvalorizar, mesmo a mais abjecta das propostas - aquelas que deveriam arrepiar qualquer ser humano - tem os seu

Subjacente ao fascismo

O neoliberalismo deu à luz gerações de frustrados, despidos de qualquer esperança num futuro melhor para si e para os seus, empenhados em dirigir a revolta contra os que lutam politica e democraticamente contra as desigualdades, sempre na expectativa do regresso de um pai que os proteja e que lance luz sobre um mundo que já não compreendem e que lhes causa tanto sofrimento. É também desta forma que se explica a ascensão dos movimentos fascistas. De resto, essas gerações que outrora se sentiam confortavelmente nas classes médias ou com esperanças de vir a entrar nesse clube, agarram-se agora ao primeiro ditador boçal, invariavelmente armado com um discurso simplório, mas pejado de ódio, um ódio que é simultaneamente um sucesso precisamente por ser um ódio contra si próprio. Por outro lado, o terreno não podia ser mais propício ao regresso do fascismo: a tecnologia cria a ideia de desenvolvimento e de mais informação. Pelo caminho não existe cultura democrática, apenas

A ascensão do ódio

Não sabemos qual será o resultado da segunda volta das eleições no Brasil, mas Bolsonaro parece muito bem posicionado para ser Presidente do maior país da América do Sul. Apenas uma grande coligação pró-democracia pode eventualmente evitar o pior dos cenários - sim, Bolsonaro é a antítese da democracia e pode muito bem juntar-se a Duterte, Órban, Trump, Erdogan, Salvini e Putin. Ainda assim, Bolsonaro, ordinário, justicialista, misógino, homofóbico e por aí fora, bem ladeado por evangelistas, consegue a proeza de ser ainda pior do que as figuras atrás enunciadas. Entretanto outros se prepararam para chegar ao poder através de um ideário racista, misógino, com excitação pela autoridade de chefes masculinos, com propostas de deportações de massa, banalizando a violência, transformando-a numa coisa aceitável e até necessária, invariavelmente enquadrados numa espécie de luta pobremente inspirada nas teorias de Darwin, em plena exultação de massas. Em suma, fascismo. Em sum