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Os tempos do homem-massa

No anos trinta do século passado Ortega y Gasset alertou para os perigos da sociedade de massas e para o homem-massa e começou por chamar a atenção para o paradoxo do homem-massa rejeitar a oportunidade única de viver plenamente em tempos livres da tirania, marcados pelas promessas da tecnologia e pela democratização da política, com realidades até então pouco consolidadas como a liberdade.
O filósofo espanhol caracteriza o homem-massa da altura como sendo alguém que rejeita os valores intelectuais e espirituais, recusa a verdade, abraçando o egocentrismo e o materialismo; o homem-massa rejeita a opinião do outro e tem aversão a qualquer coisa remotamente semelhante ao espírito crítico; conforma-se; o homem-massa não tem particular predilecção pelo belo ou até pela cultura; rejeita a diferença e ele próprio não aceita ser diferente das massas; subjuga-se, no tempo de Ortega y Gasset à comunicação social, hoje também e sobretudo às redes sociais; o homem-massa não pensa nem tem referências e deixa-se ir com as massas e quando são estas a governar, quando se transforma a democracia numa democracia de massas, segundo o filósofo, a própria democracia deixa de existir.
Talvez os tempos tenham sido, desde o tempo de Gasset, os tempos do homem-massa. No entanto, depois de uma crise económica da qual nunca ninguém verdadeiramente se recompôs, num contexto de admirável mundo novo das tecnologias e das promessas que as mesmas fazem e com o declínio dos partidos tradicionais, vistos como incapazes de resolverem os problemas das pessoas, o homem-massa pode novamente brilhar sem complexos e sem vergonha, mesmo que seja o maior imbecil à face da terra - os tempos são dele e como são promissores.

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