Em
Portugal o TTIP (Transantlatic Trade and Investment Partnership) é
um perfeito desconhecido. Ou seja, o acordo que visa regular o
comércio entre União Europeia e Estados Unidos não merece tempo de
antena ou páginas de jornais. Dir-se-á que o secretismo em torno
das negociações poderá justificar a inexistência de notícias
sobre o assunto. Então e o que dizer das fugas de informação e as
subsequentes quezílias entre o negociador-chefe da UE e os deputados
europeus? E o que dizer da forma humilhante que rodeia o parco acesso
dos deputados eleitos pelos povos europeus aos documentos do TTIP?
Nada disto merece destaque na comunicação social portuguesa? Talvez
não. Com efeito, entre o desastre gramatical de um treinador de futebol, as
inanidades proferidas por alguns políticos, e o próximo campeão
nacional de futebol, resta pouco tempo... restam poucas páginas...
Seria
expectável que a gravidade das alterações que o TTIP implica (do
que se conhece) merecesse ainda assim alguma atenção. Senão
vejamos: o TTIP visa, claro está, no bom espírito neoliberal, os
serviços públicos, estando prevista mais desregulação e as já
tão conhecidas privatizações. Em matéria laboral, prevê-se
igualmente mais desregulação numa aproximação à legislação
laboral americana, se é que, no contexto americano, se pode falar em
legislação laboral. O TTIP contempla um enorme retrocesso para a UE
no que diz respeito ao ambiente e à segurança alimentar, reinando o
laxismo americano em benefício das grandes multinacionais, com
incomensuráveis custos ambientais e para a saúde. O TTIP pretende
recuperar legislação como a moribunda ACTA (Anti-Counterfeiting
Trade Agreement) colocando um ponto final à privacidade tal como a
conhecemos, assim como com este acordo se propõe mais desregulação
bancária, mesmo aquilo que o mundo necessita.
Mas
o TTIP e já agora a CETA (acordo de comércio livre com o Canadá)
são sobretudo a antítese da democracia, não só pelo secretismo e
pela incapacidade dos cidadãos se pronunciarem sobre acordos que
mudarão as nossas vidas, como também pelo enfraquecimento do Estado
de Direito -tribunais perdem competência para tribunais
arbitrais fora do âmbito dos países, em que empresas podem acusar
Estados que comprometam os seus lucros, como serão essas empresas a
moldar as decisões que outrora pertenciam exclusivamente à esfera
dos representantes políticos eleitos. E se agora falamos de perda de
soberania, na medida em que as grandes multinacionais e o sector
financeiro influenciam obscenamente as decisões políticas, o que
dizer do dia em que essas empresas ganharem tudo quanto é processo
judicial apenas porque um Estado decidiu aumentar o salário mínimo,
prejudicando os lucros de uma empresa? Ou quando um Estado decide
colocar um ponto final na energia nuclear por esta representar uma
ameaça aos seus cidadãos e esse mesmo Estado ser processado por uma
multinacional que não terá os lucros almejados?
Escusado
será continuar a falar em democracia, quando o povo soberano já não
toma quaisquer decisões ou quando o povo vê as acções dos seus
representantes eleitos comprometidas.
De
facto, nada disto importa à comunicação social portuguesa; nada
disto interessa a boa parte dos cidadãos deste país.
Não haverá razões para isso.
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