Negociações duras e uma proposta
grega que surpreendeu por retomar a austeridade, depois do povo grego
ter dito “não” ao acordo proposto pela Europa marcaram os
últimos dias.
Vamos assistindo à constante
diabolização da Grécia, forçando-se ideias derrotistas e
esquecendo o papel da Alemanha, coadjuvada por países como a
Finlândia, que nestes passarão a fazer parte das páginas mais
negras do que resta do projecto europeu. Entre propostas vergonhosas
de venda por parte dos gregos de 50 mil milhões euros em activos –
e novas propostas, ou seja com mais austeridade – ou teriam que
sair temporariamente (?) do euro, durante um período de 5 anos,
assim se vai destruindo o que resta de uma ideia de Europa.
A comunicação social insiste em
simplificar o que exige tempo para ser analisado. Segundo os
principais meios de comunicação social, o plano de Tsipras ainda
era pior do que o de Junker, embora o plano de Juncker fosse para 5
meses contendo 8 mil milhões de euros de austeridade e o de Tsipras
englobasse 3 anos, com medidas que representam 13 mil milhões de
euros de austeridade.
De fora do discurso partilhado por
comunicação social e responsáveis europeus, ficaram as reformas
propostas pelo Governo de Tsipras com a finalidade de combater a
fraude e evasão fiscal (invariavelmente mal vistas pela troika);
fora do discurso ficou a utilização de 35 mil milhões de euros de
fundos estruturais que os governos anteriores não aplicaram, a par
de uma proposta de acesso ao novo plano europeu de investimentos que,
por ora, exclui a Grécia; igualmente de fora ficou a tão necessária
reestruturação da divida ou a existência de um plano de cobertura
das necessidades de financiamento da Grécia para 3 anos ao invés do
plano anterior que previa dinheiro apenas para pagamento de dívida;
de fora ainda ficaram o aumento de impostos sobre bens de luxo,
aumento do IRS e a existência de uma cláusula de revisão de
aumento do IVA para 2016 relativamente a bens que afectam os sectores
mais fragilizados da sociedade; bem assim a comunicação social
esqueceu a reintrodução da negociação colectiva, a recusa de
privatizar o sector da electricidade, a recusa do défice zero, a
redução do IVA nos medicamentos, livros e peças de teatro ou o
aumento de impostos sobre o armadores gregos a par da eliminação de
benefícios fiscais. Importa referir que o plano de Tsipras
implicaria a saída do FMI da equação, o regresso aos mercados e a
troca de dívida de curto prazo por dívida de longo prazo.
Paralelamente, o plano previa ainda a
privatização (não total) dos portos e das telecomunicações, o
aumento de impostos sobre a restauração e electricidade e o corte
do famoso EKAS (complemento solidário de idosos), apesar da promessa
de ser eliminado até 2020 (o programa começaria em 2015 e
terminaria em 2018), sendo que este corte incidiria sobre pensões
mais elevadas, foi sobre estes últimos aspectos do plano que
comunicação social, genericamente, se debruçou.
O programa proposto por Tsipras contém
austeridade e é o possível no contexto da zona euro. A Grécia
precisa de tempo e estabilidade e o que recebe da Europa é pressão,
intransigência e humilhação.
Depois do que se passou durante o
fim-de-semana é difícil vislumbrar alguma espécie de futuro na
Zona Euro. Se já se tinha percebido que a moeda única funcionava de
forma deficiente e esmagava os países mais pobres enquanto o mais
ricos agem como necrófagos até do ponto de vista fiscal, hoje é
claro que politicamente não existe esperança para a Zona Euro e por
inerência para a própria UE.
A Grécia foi só o princípio, outros
se seguirão até à derrocada final. Para já a Europa humilha-se a
si própria.
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