Avançar para o conteúdo principal

Mentirosos, uivos e animais

No essencial a discussão quinzenal no Parlamento resumiu-se às palavras em epígrafe. A discussão entre Francisco Louça e o primeiro-ministro José Sócrates caracterizou-se pelo exacerbamento da linguagem e pela irascibilidade de parte a parte. Outros deputados, designadamente da bancada socialista acompanharam o mote e contribuíram para a deterioração da imagem da classe política, e mais grave, da imagem da casa da democracia.
A discussão política torna-se amiúde mais acesa, ocorrendo porventura excessos de linguagem, muitos comuns na Assembleia da Madeira, por exemplo. Mas esses excessos necessitam de correcção que só podem advir da sensatez dos principais intervenientes. Essa moderação torna-se imperiosa numa altura em que os cidadãos têm uma imagem negativa da política e da classe política. A elevação no discurso e a verticalidade dos políticos é condição sine qua non para elevar também a política e as instituições democráticas a um patamar mais elevado.
Paralelamente, os responsáveis governativos têm sido comedidos nas explicações que dão ao país e demonstram um acentuado grau de arrogância e até algum desprezo pelas preocupações dos cidadãos. Os membros do Governo e em particular o primeiro-ministro manifestaram sempre uma incapacidade em dialogar com os Portugueses e, claro está, com a oposição. Havendo certamente quem aprecie o estilo do primeiro-ministro, mimetizado por vários membros do Executivo, a verdade é que o seu contributo para a consolidação da democracia tem sido praticamente nulo. A recusa do diálogo, os excessos de linguagem, a irascibilidade perante perguntas difíceis, sejam elas colocadas pela comunicação social ou pela oposição, são maus contributos para a pluralidade democrática.
Com efeito, governar não é apenas fazer a gestão de dinheiros públicos, estabelecendo prioridades na distribuição desse dinheiro. Governar é saber estabelecer consensos, é dialogar, é ser determinado numa perspectiva de exposição de argumentos que sustentem essa determinação. O Governo falhou no diálogo e só estabelece pontes quando é fortemente pressionado ou em vésperas de eleição.
Todavia, este episódio no Parlamento teve igualmente outros protagonistas. Não é correcto afirmar-se que os membros da outra bancada “uivam”, assim como as acusações mútuas de “mentiroso” ou de “animais” não enriquecem o debate político. São palavras que no momento podem parecer bons "sound bytes", mas que ninguém honestamente pode apreciar.
O debate parlamentar merece outra elevação e merece também o exercício de digladiar argumentos que esclareçam os cidadãos. A democracia, palavra vã para muita gente, fortalece-se particularmente com a contribuição dos partidos políticos. Quando se perde o respeito mútuo está-se a dar um mau exemplo a um país atormentado e dar uma péssima imagem daquilo que deve ser uma democracia representativa e pluralista.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Mais uma indecência a somar-se a tantas outras

 O New York Times revelou (parte) o que Donald Trump havia escondido: o seu registo fiscal. E as revelações apenas surpreendem pelas quantias irrisórias de impostos que Trump pagou e os anos, longos anos, em que não pagou um dólar que fosse. Recorde-se que todos os presidentes americanos haviam revelado as suas declarações, apenas Trump tudo fizera para as manter sem segredo. Agora percebe-se porquê. Em 2016, ano da sua eleição, o ainda Presidente americano pagou 750 dólares em impostos, depois de declarar um manancial de prejuízos, estratégia adoptada nos tais dez anos, em quinze, em que nem sequer pagou impostos.  Ora, o homem que sempre se vangloriou do seu sucesso como empresário das duas, uma: ou não teve qualquer espécie de sucesso, apesar do estilo de vida luxuoso; ou simplesmente esta foi mais uma mentira indecente, ou um conjunto de mentiras indecentes. Seja como for, cai mais uma mancha na presidência de Donald Trump que, mesmo somando indecências atrás de indecências, vai fa

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação e Trump é o ma

Normalização do fascismo

O PSD Açores, e naturalmente com a aprovação de Rui Rio, achou por bem coligar-se com o "Chega". Outros partidos como o Iniciativa Liberal (IL) e o CDS fizeram as mesmas escolhas, ainda que o primeiro corra atrás do prejuízo, sobretudo agora que a pandemia teve o condão de mostrar a importância do Estado Social que o IL tão avidamente pretende desmantelar, e o segundo se tenha transformado numa absoluta irrelevância. Porém, é Rui Rio, o mesmo que tem cultivado aquela imagem de moderado, que considera que o "Chega" nos Açores é diferente do "Chega" nacional. Rui Rio, o moderado, considera mesmo que algumas medidas do "Chega" como a estafada redução do Rendimento Social de Inserção é um excelente medida. Alheio às características singulares da região, Rui Rio pensa que com a ajuda do "Chega" vai tirar empregos da cartola para combater a subsidiodependência de que tanto fala, justificando deste modo a normalização que está a fazer de um pa