
Vários títulos poderiam ter sido utilizados para este texto: deserto político, vazio de ideias, primazia da vulgaridade, etc. De facto, os partidos políticos estão a atravessar um período de acentuada instabilidade, o que agrava o já preocupante distanciamento que se verifica entre políticos e cidadãos. Depois dos lamentáveis episódios no PSD, não se pode estar à espera de uma súbita reconciliação ou re-aproximação entre cidadãos e partidos políticos. Nem tão-pouco terá sido por acaso que nas eleições de Lisboa, muitos eleitores tenham votado em movimentos independentes.
Por um lado, verifica-se uma torrente de momentos infelizes na campanha para as directas do PSD. Quando se designa o seu opositor por “pequeno tirano” está-se a prestar um péssimo serviço ao partido e ao país. São momentos que denotam uma inequívoca irresponsabilidade que não podem ser encarados com ligeireza. Além de episódios desta natureza, não se tem assistido a um verdadeiro debate de ideias entre os dois candidatos à liderança do PSD – a candidatura de Luís Filipe Menezes alterna entre as acusações à actual liderança e a vociferação de meia dúzia de palavras vazias e desprovidas de interesse, reina, pois, o populismo; o candidato Marques Mendes tem evitado a retórica populista e sem nível do seu adversário, mas tem manifestado uma incapacidade para mostrar aos portugueses os seus projectos, e fundamentalmente, tem sido incapaz de mostrar em que é que é diferente do PS.
Mas não se pense que a crise política – crise de ideias, crise de liderança, crise de protagonistas – afecta apenas o PSD, o PS, por exemplo não escapa incólume aos problemas que são transversais a todo o espectro político português. Na verdade, o PSD está numa situação de maior visibilidade, e o facto de se encontrar na oposição não facilita a tarefa do seu líder – não esqueçamos que muita gente nos partidos vive do poder e dos lugares que o poder proporciona. Em rigor, o PS é um partido silencioso que segue cegamente o seu líder e o Governo. O PS é um partido cujas principais referências ou se apagaram ou se resignaram aos ditames oficiais do líder. O PS é hoje um partido incipiente.
Esta conjuntura é manifestamente desfavorável à consolidação da democracia portuguesa. Note-se que os partidos políticos têm uma importância indubitável na vida democrática, e que as suas atribulações afectam inevitavelmente a qualidade da democracia em Portugal. Da mesma forma, o distanciamento que se agrava entre cidadãos e partidos políticos é um sinal que deve ser levado muito a sério pelos próprios partidos políticos.
Ora, existe uma multiplicidade de razões que justificam essa clivagem entre políticos e cidadãos: as animosidades internas, a ausência de figuras de referência no seio dos partidos, as lideranças anódinas ou populistas, o estado do país e a não evolução do mesmo, etc. Seja como for, este é o cenário ideal para um primeiro-ministro que governa sem oposição, conta com a complacência da comunicação social e com a resignação dos portugueses, recorrendo à propaganda barata, e se por algum acaso, as coisas não correm como planeado, então que venha a arrogância e o autoritarismo. Enquanto os partidos políticos não expurgarem a vulgaridade, a demagogia saloia, os insultos, e o mais completo e inexorável vazio de ideias, não contem com os portugueses para o circo em que se está a tornar a política em Portugal.
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