Avançar para o conteúdo principal

Miséria política

Não é propriamente novidade que o Governo não é adepto do diálogo, nem tão pouco é apologista do debate de ideias. Ficou-se agora a saber que o Governo, na pessoa da ministra da Educação, não tolera as críticas – o caso da associação de professores que foi expulsa de uma reunião de trabalhos é sintomático da arrogância desmedida que tomou conta de alguns membros deste Governo. Depois do deplorável episódio do ministro das Obras Públicas, fazendo algumas analogias de mau gosto, chegou agora a vez da intolerância fazer os seus estragos
Este é mais um episódio no extenso rol de incongruências expressas pela ministra – o caso da DREN merecia da parte da ministra muito mais do que a sua displicência. Estes são alguns casos do autoritarismo que parecem ser a marca do actual Executivo. Mas o que é curioso é a aceitação – sob a forma de sondagens – que este Governo tem. Como é que se explica essa aceitação quando o estado do país não é o melhor, e ainda para mais assiste-se à eclosão de episódios que denotam uma intolerância inquietante?
Os portugueses, depois de anos de miséria política, já aceitam qualquer coisa que aparentemente funcione. O Governo envolto numa imagem progressista e com o seu apetite voraz pelas reformas – profícuas ou não, é irrelevante –, conquistou os portugueses, ou pelo menos, e segundo as sondagens, a maioria dos portugueses. Por outro lado, não há oposição digna desse nome. Se olharmos para o espectro político não vemos mais do que um deserto de ideias (Mário Lino enganou-se na localização do deserto - é na Assembleia da República). Lamentável destino o nosso que nos obriga a aceitar a intolerância e a inépcia pelo simples facto de não haver quem faça melhor.
Só assim se explica a aceitação destes episódios, só assim se explica o silêncio e a resignação a que o Presidente da República fez referência. Não há outra explicação para justificar o vasto conjunto de sondagens favoráveis ao Governo. Isto porque, para além da gravíssima intolerância já referida, o estado do país não vai melhor:

1 – O facilitismo tomou conta da educação;

2 – Na justiça a morosidade e ineficácia persistem;

3 – A tão prometida reforma da Administração Pública está muito atrasada e até ao momento cinge-se apenas aos funcionários públicos de forma genérica, ficando ainda por mexer nas clientelas político-partidárias, por exemplo;

4 – Na saúde encerram-se hospitais e centros de saúde sem se perceber bem se o ministro sabe o que está a fazer; depois do anúncio do encerramento de uma unidade de saúde, dá-se o dito pelo não dito;

5 – O desemprego continua a subir e o poder de compra a baixar;

6 – A precariedade do emprego é uma realidade insofismável deste país, hipotecando o futuro, em particular dos jovens;

7 – As reformas serão cada vez mais magras, isto é vendido aos portugueses como sendo mais uma inevitabilidade.

8 – A generalidade dos políticos continua a viver numa redoma de hipocrisia que lhes impede de ver as dificuldades cada vez maiores com que os portugueses têm de lidar no seu dia-a-dia;

Nada disto parece importar, afinal de contas e depois de três governos que não levaram as suas governações até ao fim, o actual Executivo não parece, aos olhos de muitos portugueses, assim tão mau. Continuaremos, pois, no nosso cantinho da Europa, à espera do melhor que ainda está para vir.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...