Avançar para o conteúdo principal

Em Portugal ainda se discute tourada. A sério.

Pior, a discussão – pelo menos aquela que terá efeitos práticos – nem sequer toca na tourada propriamente dita, mas sim como deve a carga fiscal incidir sobre esse bárbaro espetáculo. A sério.
Por aqui, em pleno século XXI, discute-se se a tourada é ou não cultura; se o acto de espetar farpas num animal (amiúde com as suas defesas enfraquecidas, designadamente com pontas cortadas e afins) é civilização ou nem por isso. A sério.
Veio tudo isto a propósito de declarações da ministra da Cultura, de uma troca de cartas entre Manuel Alegre e António Costa e agora o próprio Partido Socialista, ou parte dele, que se movimenta em sentido diametralmente oposto ao do Governo, no preciso sentido de facilitar a promoção da sofrimento e do sangue de um animal para gáudio sádico dos humanos. A sério.
Quem esfregue os olhos com o intuito de acordar deste espetáculo surreal rapidamente se apercebe de que não se trata de um sonho: Portugal é um país fundamentalmente atrasado nesse particular e mais atrasado se torna quando pretende fazer a defesa do indefensável a coberto de uma argumentação patética, recorrendo à cultura, à civilização e até – pasme-se! - à liberdade, como se liberdade existisse para validar o sofrimento e o sangue, mesmo de um animal.
E apenas se discute a questão fiscal, porque essa é a discussão que vale na medida em que terá qualquer efeito. Não se debate o fim dos subsídios estatais à barbárie, nem se ousa discutir o fim da barbárie. Não há coragem. Teme-se a perda de votos, outros mantêm-se ao lado dos caciques que promovem este triste espetáculo. É cultura, é tradição, é importante para a economia (as drogas pesadas, se legalizadas, também teriam impacto económico, mas aqui o argumento, sabe-se lá porquê não serve, não serve), vociferam os apoiantes da barbárie. Debate-se tão só qual a taxa de IVA, num país que permanece atrasado e de lá não parece querer sair.
A sério.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Mais uma indecência a somar-se a tantas outras

 O New York Times revelou (parte) o que Donald Trump havia escondido: o seu registo fiscal. E as revelações apenas surpreendem pelas quantias irrisórias de impostos que Trump pagou e os anos, longos anos, em que não pagou um dólar que fosse. Recorde-se que todos os presidentes americanos haviam revelado as suas declarações, apenas Trump tudo fizera para as manter sem segredo. Agora percebe-se porquê. Em 2016, ano da sua eleição, o ainda Presidente americano pagou 750 dólares em impostos, depois de declarar um manancial de prejuízos, estratégia adoptada nos tais dez anos, em quinze, em que nem sequer pagou impostos.  Ora, o homem que sempre se vangloriou do seu sucesso como empresário das duas, uma: ou não teve qualquer espécie de sucesso, apesar do estilo de vida luxuoso; ou simplesmente esta foi mais uma mentira indecente, ou um conjunto de mentiras indecentes. Seja como for, cai mais uma mancha na presidência de Donald Trump que, mesmo somando indecências atrás de indecências, vai fa

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação e Trump é o ma

Normalização do fascismo

O PSD Açores, e naturalmente com a aprovação de Rui Rio, achou por bem coligar-se com o "Chega". Outros partidos como o Iniciativa Liberal (IL) e o CDS fizeram as mesmas escolhas, ainda que o primeiro corra atrás do prejuízo, sobretudo agora que a pandemia teve o condão de mostrar a importância do Estado Social que o IL tão avidamente pretende desmantelar, e o segundo se tenha transformado numa absoluta irrelevância. Porém, é Rui Rio, o mesmo que tem cultivado aquela imagem de moderado, que considera que o "Chega" nos Açores é diferente do "Chega" nacional. Rui Rio, o moderado, considera mesmo que algumas medidas do "Chega" como a estafada redução do Rendimento Social de Inserção é um excelente medida. Alheio às características singulares da região, Rui Rio pensa que com a ajuda do "Chega" vai tirar empregos da cartola para combater a subsidiodependência de que tanto fala, justificando deste modo a normalização que está a fazer de um pa