Há
um Donald Trump para além da boçalidade, xenofobia, misoginia e
intolerância; existe um Donald Trump que, embora de forma simplista,
atacou aquilo que parte da esquerda ataca: a desregulação, o
desemprego, os bancos, os mercados financeiros, os acordos
internacionais repletos de mais desregulação, a OMC, etc. Bandeiras
da esquerda, mas não do Partido Democrata, assim como não são
bandeiras de boa parte de partidos socialistas europeus que apoiam de
forma mais ou menos frontal o neoliberalismo.
Os
que são prejudicados pela globalização, pelo menos em parte
significativa, olharam com bons olhos para o discurso simplista de
Trump, embora o mesmo tenha contradições evidentes, designadamente
em matéria fiscal, sendo simultaneamente desprovido de conteúdo -
frases soltas e acusações que produziram o efeito desejado.
A
esquerda americana, mal representada pelo Partido Democrata de
Hillary Clinton, foi absolutamente ultrapassada pelo populismo de
Trump que disse o que muitos quiseram ouvir, como se ele fosse o
salvador da pátria, sempre com promessas de regresso a um passado
glorioso. Claro que a exequibilidade das medidas e o conteúdo das
mesmas não foram chamadas à colação.
Sem
sindicalismo e com movimentos sociais fragmentados e distantes da
esquerda, surgiu um sinal de esperança com Bernie Sanders que, com
substância enumerou as grandes dificuldades da globalização,
designadamente no que diz respeito aos mercados e à sua
desregulação, fazendo jus ao ideário de esquerda. O que aconteceu
depois já nós conhecemos – os guardiões do neoliberalismo
entraram em campo.
A
esquerda foi ultrapassada pelo populismo, naturalmente sem
substância, apoiado no preconceito, simplista, ilusório e tantas
vezes repleto de contradições.
Resta
à esquerda americana e não só, unir-se em torno de um discurso que
vá ao encontro dos trabalhadores americanos, sem perder de vista
aquilo que está subjacente às crises, ao desemprego e à
precariedade, com protagonistas como Bernie Sanders e outros que se
mantêm à distância dos interesses económicos, sem cair no
populismo salvífico e, sobretudo, sem dividir as sociedades e que possam
verdadeiramente defender os interesses dos trabalhadores. Uma
esquerda que combate os que misturam mercados desregulados e
minorias, como se todos fossem responsáveis pelo desemprego, baixos
salários e precariedade; uma esquerda que, contrariamente a Trump e a outros Republicanos, faça do ambiente uma verdadeira prioridade; em suma,
uma esquerda que contrarie a ascensão desta espécie de neofascismo
crescente. Não há outra saída.
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