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Visão exígua da democracia

Depois da alegria efémera da noite das eleições, os indefectíveis apoiantes da coligação de direita questionam a legitimidade de uma solução governativa à esquerda. Durão Barroso, por exemplo, que tem a presunção de saber o que está na cabeça de quem votou Partido Socialista, considera que, caso o PS se aproxime dos partidos da esquerda, estará a defraudar as expectativas do seu eleitorado. Outros, num registo similarmente simplista, consideram que o partido mais votado - ou a solução política mais votada - é que merece ser governo. O facto de se votar em deputados para a constituição de uma Assembleia da República e daí resultar uma solução governativa ou os inúmeros exemplos de democracias europeias que encontraram soluções de governo entre partidos que, individualmente, não foram os mais votados, são questões de somenos. Assim como o facto de PSD e CDS terem feito uma coligação pós-eleitoral que nos governou nestes mais de quatro anos de inferno também parece caído num estranho esquecimento.
Seja como for, todos partilham o mesmo ódio à esquerda - nada facilitadora de negócios - e a mesma visão exígua da democracia.
É curioso verificar que a mera hipótese de uma solução de esquerda arrepia os apoiantes do status quo. Percebe-se porquê: os tais negócios são postos em causa, a visão de uma sociedade transformada num conjunto de coitadinhos silenciosos é comprometida; a desvalorização salarial e a precariedade laboral sofrem reveses; o Estado Social deixa de servir os negócios; o poder esvai-se num ápice.

Para essa visão exígua da democracia podemos também contar com uma comunicação social que faz capas com manchetes como "Medo de Catarina assusta bolsa" ou os comentadores de pacotilha que destilam ódios à esquerda confundindo deliberadamente as questões de legalidade com a discussão política.
Tudo somado dá um país muito longe de ter atingido a maturidade democrática.

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