Avançar para o conteúdo principal

A apatia intrínseca ao “está tudo bem”

É consensual que estamos muito longe de estar bem; sabemos que está tudo, mas agimos como se estivesse tudo bem; agimos como se tudo fosse suportável; sucumbimos à apatia do está tudo bem.
De um modo geral, vivemos bem com os atropelos à democracia e a todo o género de injustiça.
As dificuldades financeiras, o sufoco causado pelos créditos só vieram agravar um estado generalizado de apatia, de sofrimento escamoteado.
De resto, essa apatia apenas encontrou o contexto ideal: uma educação que promove a passividade, desprezando a diversidade própria da democracia; uma educação e uma sociedade que promovem o individualismo, ignorando em absoluto o motor da evolução da espécie humana: a cooperação. Por outro lado, e ainda enquadrado no já referido contexto, verifica-se um desânimo que assola sobretudo aqueles que não têm ocupação e que sentem que não têm um lugar na sociedade – a vergonha de não trabalhar, de não estudar, vergonha essa que redunda amiúde na mais inexorável ausência de participação na vida colectiva. “Colectivo”: palavra conspurcada por ideologias nefastas, esquecida, ignorada, desprezada.
A televisão – peça central no mencionado contexto – nas mãos de quem pugna pela passividade, pela apatia; televisão nas mãos de quem teme que a falsa normalidade seja colocada em causa; nas mãos dos defensores indefetíveis do status quo. Com a televisão não há lugar ao pensamento crítico; tem sido como alguns já referiram um “agente pacificador” que alimenta o medo, sobretudo o medo do outro.
E finalmente, o contexto não seria bem um contexto sem o consumismo excessivo. A publicidade nefasta, defensora da uniformização e da manipulação – mentiras para alimentar a apatia reinante, arauta do individualismo que invalida o colectivo e sentimentos associados ao colectivo como o caso da solidariedade e do bem comum.
No actual estado de apatia generalizada que tomou conta das sociedades ocidentais verifica-se que a mudança tarda de facto a chegar. Ainda assim e apesar do contexto acima descrito, acredito que a mudança chegará. Um dia. No dia em que a apatia do está tudo bem for obnubilada pelo peso da realidade.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Normalização do fascismo

O PSD Açores, e naturalmente com a aprovação de Rui Rio, achou por bem coligar-se com o "Chega". Outros partidos como o Iniciativa Liberal (IL) e o CDS fizeram as mesmas escolhas, ainda que o primeiro corra atrás do prejuízo, sobretudo agora que a pandemia teve o condão de mostrar a importância do Estado Social que o IL tão avidamente pretende desmantelar, e o segundo se tenha transformado numa absoluta irrelevância. Porém, é Rui Rio, o mesmo que tem cultivado aquela imagem de moderado, que considera que o "Chega" nos Açores é diferente do "Chega" nacional. Rui Rio, o moderado, considera mesmo que algumas medidas do "Chega" como a estafada redução do Rendimento Social de Inserção é um excelente medida. Alheio às características singulares da região, Rui Rio pensa que com a ajuda do "Chega" vai tirar empregos da cartola para combater a subsidiodependência de que tanto fala, justificando deste modo a normalização que está a fazer de um pa...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...