A pretexto de uma crise criada por quem hoje tira benefícios da mesma, um governo parece apostado em tudo fazer para recuperar o país. Por outro lado, esse mesmo governo vê-se sem alternativas, depois de largos anos de despesismo e de um memorando imposto por instâncias internacionais. Disseram-nos, até à exaustão.
Nesse sentido, esse dito governo viu-se forçado a cortar em salários, pensões e no Estado Social. Não havia outra alternativa, foi-nos dito, até à exaustão. De resto, todos vivemos acima das nossas possibilidades e se as coisas não resultarem por aqui há sempre a possibilidade de sair do país em busca de uma nova aventura.
Diz-se que o primeiro-ministro, o seu governo e o seu partido padecem de uma incomensurável insensibilidade social. Mas será mesmo? Se assim é, o que dizer do chumbo no Parlamento da Lei da Co-adopção?
Até há pouco tempo o governo mais não fazia do que cumprir o desígnio neoliberal: empobrecimento de uma vasta maioria, ao mesmo tempo em que uma minoria exígua e plutocrata enriquece. O governo, ou melhor, o PSD, lembra-se de trazer à discussão o tema da co-adopção. Nada melhor para desviar as atenções. Mas não se estará a ir longe demais? Se acrediramos que os cortes em pensões, salários e no Estado Social são dramáticos; se nos convencemos de que o desemprego é um dos piores flagelos sociais, o que dizer da instrumentalização de políticas que deveriam ter no seu cerne o bem-estar de crianças? Ou seja, uma criança pode viver com dois progenitores do mesmo sexo, mas se um falece, essa mesma criança - criada pelos dois - já não poderá ficar com o sobrevivente. Não haja dúvidas: a história da co-adopção não passou de uma manobra dos partidos da maioria, havendo claramente uma tentativa de se instrumentalizar uma questão de uma sensibilidade indiscutível. Foi-se, indubitavelmente, longe de mais.
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