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Incoerências

É uma acusação reiterada. E também é uma acusação que recai sobre aqueles que não se coíbem de expor a sua opinião e sobre aqueles que têm a coragem de deixar a sua opinião documentada, recorrendo para tal à escrita. Para esses a incoerência é, amiúde, uma inevitabilidade.
Ora, a pretensa falta de coerência não é mais do que uma adaptação a circunstâncias excepcionais. Veja-se, por exemplo, os tempos em que vivemos. Se a preponderância dos mercados já é notória há décadas, nunca antes a situação se agravou ao ponto de pôr em causa tanto o bem-estar dos cidadãos como os próprios sistemas democráticos.
Nestas circunstâncias, não será de esperar uma reacção que não passe pela crítica à globalização assente no capitalismo financeiro. Foi a crise de 2008 que deixou a descoberto a selvajaria que domina o mundo. Foram os anos subsequentes a mostrar como é que essa selvajaria continua a reger as nossas vidas. E foi essa selvajaria a empolar as dívidas soberanas criando as oportunidade ideal para se introduzirem políticas neoliberais cujo objectivo é a destruição do Estado Social e dos direitos dos cidadãos. Portugal é um bom exemplo dessa investida. Ficando o capital de fora da voracidade fiscal.
Estes não são problemas de hoje. Trata-se de uma situação resultante da queda do sistema Bretton-Woods. Todavia, tudo se precipitou desde 2008,o que deu origem a críticas mais cerradas de pessoas como a autora deste blogue que, embora fosse crítica das desigualdades resultantes da globalização selvagem, não reiterava essas críticas suficientemente - reconheço agora.
Quanto à situação do país. Este blogue sempre foi um local de crítica do anterior governo, Na educação, na Justiça, na corrupção e na escolha de um modelo económico que não estava a produzir os efeitos desejados, num misto de liberalismo e de socialismo envergonhado.
A incoerência que possa recair sobre os textos deste blogue não são mais do que o reforço dado a um problema que nos atinge a todos, fruto da globalização financeira. Um problema cujas soluções são assentes nas mesmas receitas que o criaram. É difícil assistirmos à retrocesso social e à destruição das próprias democracias e, simultaneamente, mantermo-nos serenos. A incoerência não é incoerência nenhuma. O que se procura é colocar a ênfase nos problemas. Hoje, mais do que nunca, o problema é um sistema global que potencia injustiças, que cria crises atrás de crises, sistema essa que cria divisões entre os povos e que mina as democracias. Não perceber isto é não perceber o mundo em que se vive.
Paralelamente, Portugal padece dos seus problemas que não me canso de referir: a corrupção e a Justiça, a partidocracia, a existência de uma casta de priveligiados que comanda os destinos do país há largas décadas e que o leva à ruína.
Ora, o que talvez ainda tenha de explicar novamente seja o facto de ambos os problemas supracitados coexistirem. Os problemas do país e os problemas decorrentes da selvajaria dos ditos mercados. E também neste particular, haverá sempre quem não queria perceber essa coexistência. Para muitos os problemas são invariavelmente analisados com recurso a dualidades, ou é preto ou é branco, ou é bom ou é mau. Não tenhamos dúvidas que a vida assim torna-se mais simples.

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