Avançar para o conteúdo principal

Voto nulo

O surgimento de um movimento que pugna pelo voto nulo é mais um sinal da descrença de muitos portugueses no sistema político-partidário que foi criado em Portugal. Na sua essência, o partido em questão defende o voto nulo já nas próximas eleições, enfatizando a defesa da democracia, mas não escondendo a sua rejeição dos partidos políticos portugueses. Apesar de se reconhecer legitimidade no uso deste tipo de voto, não será de uma maiorproficuidade insistir em mudanças necessárias, difíceis é certo, do que simplesmente desistir? E mesmo que o voto em branco seja encarado como um voto de protesto, a verdade é que não estou assim tão certa que essa poderá ser a solução.

Não existem dúvidas quanto à falta de qualidade, competências e sensatez dos principais intervenientes políticos, e além do mais, são invariavelmente os mesmos a representarem os cidadãos. Veja-se as listas de deputados do PSD para as próximas eleições: onde está a renovação? E no PS? E nos restantes partidos? Ou mantém as mesmas pessoas que passam uma vida a saltar de lugar para lugar sem deixarpropriamente saudades, ou mudam as caras, mas mantém a mesma cartilha ideológica caduca que já não convence ninguém.

Nestas circunstâncias, não causa grande espanto que surjam cidadãos isolados ou organizados em movimentos que advoguem soluções como a do voto nulo. Considero que se trata, porquanto, de uma inevitabilidade. De facto, a classe política, ou uma partesignificativa dela tem testado reiteradamente os limites dos cidadãos e embora se deva rejeitar qualquer generalização, a verdade é que a imagem que os portugueses têm da sua classe política é manifestamente negativa e compromete o próprio processo de consolidação democrática.

Com efeito, é o sistema democrático que sai visivelmente prejudicado pela actuação de parte da classe política. Afinal de contas, os partidos políticos são um dos pilares da democracia. Todavia, a ausência de verdadeiros debates de ideias - hoje discutem-se minudências e personalidades, nunca ideias -, o compadrio, a corrupção e a promiscuidade, a incompetência, e o mais completo desprezo pelo bem comum são elementos que enfraquece sobremaneira a imagem dos políticos. Resta saber se o voto nulo possa contribuir para alterar o actual estado de coisas. Parece-me que seria mais importante e até profícuo que se procurasse envidar esforços para que haja mudanças na natureza dos partidos políticos, que não se fechasse as portas a movimentos de cidadãos e que o cidadão adoptasse uma postura mais atenta no que diz respeito aos seus representantes eleitos. Existe uma multiplicidade de diferentes formas de se exercer uma cidadania mais activa e participativa, que não passa apenas pela injúria esporádica. A responsabilidade é essencialmente nossa, não é por acaso que pululam políticos que são eleitos do Continente à Madeira e que não primam pela transparência, competência e, por vezes, nem respeito têm pelas respeito pelas instituições democráticas e pelos cidadãos. São muitos de nós legitimam esses mesmos políticos que fazem de Portugal uma partidocracia sem vergonha.

Comentários

Anónimo disse…
Votante por convicção. E a partir de Setembro não votante, por exaustão. A política central (PS ou PSD) prioriza os interesses particulares e o tráfico de influências, como se viu na elaboração das listas. Só depois, muito depois, virá o interesse geral. Basta, não me somarei aos eleitores. Estarei, quando muito, disponível para votar Nulo.

A.

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...