Avançar para o conteúdo principal

A crise pode ter aspectos positivos?

Apesar da avalanche de notícias negativas relacionada com a crise, é possível vislumbrar-se um lado mais positivo da crise internacional. Com efeito, a crise pôs a nu a forma desregulada como o sector financeiro opera - o caso português acabou por não ser excepção, com os escândalos do BPN e do BPP. Talvez se não fosse a eclosão da crise, estes casos permaneceriam incógnitos.
A palavra que se impõe para fazer face à rebaldaria que se instalou no sector financeiro, designadamente com a multiplicidade de produtos financeiros opacos, é mudança. O modo errático como os bancos têm vindo a funcionar e a exposição de todo o tipo de malabarismos financeiros e jogadas de casino exigem uma mudança radical. A crise acaba por ser responsável por uma necessidade inexorável de mudança porque o que está em causa é a viabilidade do próprio capitalismo.
Paralelamente, as vozes que criticaram, durante anos, os excessos do actual sistema são hoje ouvidas, quando há meses atrás essas vozes eram ridicularizadas ou subestimadas. Hoje é possível criticar-se abertamente os excessos do actual sistema sem se cair em rótulos antiglobalização mais próximos da esquerda radical. Esta é, de facto, uma boa notícia na precisa medida em que agora é possível que haja mais discussão sobre temas que até há bem pouco tempo raiavam o tabu.
Deste modo, um regresso à regulação e maior transparência parecem mesmo uma inevitabilidade. É certo que essa mudança não vai ocorrer no plano do imediato e vai contar com todo o tipo de resistências, mas ainda assim trata-se de uma inevitabilidade. Ora, o sistema nos moldes actuais dificilmente tem sustentabilidade, como aliás hoje é visível aos olhos de todos. Mas trata-se de uma inevitabilidade precisamente porque o que está em causa é a sobrevivência do próprio sistema.
Finalmente, importa dizer também que quando a necessidade de mudança se torna tão urgente, correm-se riscos de resvalar para outros excessos. É assim com a tentação do proteccionismo e do Estado milagreiro. Nem o mercado pode ter um estatuto divino nem o Estado. Só o regresso a lideranças políticas fortes e elucidadas é que salvar as economias de definharam ainda mais. Esse regresso pode vir a constituir outro efeito positivo que o mundo tanto precisa.
Infelizmente, continuam as más notícias, desta vez com as bolsas a cairem em função do anúncio de maus resultados de dois pesos-pesados do sistema financeiro: http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1367447&idCanal=57

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...