Avançar para o conteúdo principal

Obama e o antiamericanismo

O aparecimento de Barack Obama, a sua candidatura ao partido democrata e a sua nomeação têm contribuído para o refrear dos ímpetos mais antiamericanistas. Isto apesar de Obama ainda não ter sido eleito Presidente dos Estados Unidos.
Não se trata apenas de uma animosidade relativamente à Administração Bush, passou-se para a desconfiança que cai sobre o próprio povo americano. Não obstante a diversidade que caracteriza esse mesmo povo, a verdade é que a nomeação de Sarah Palin, candidata à Vice-Presidência ao lado de John McCain, ultraconservadora, serviu para relembrar ao mundo a existência de uma América retrógrada, radical, com laivos de manifesto imperialismo. É essa América que a Europa detesta e que Barack Obama tem feito esquecer. E também é essa América que foi responsável pela guerra no Iraque, pelo fracasso no Afeganistão, pelo enfraquecimento da influência americana, e tem sido em parte incapaz de dar resposta aos efeitos de uma crise económica que ainda assola os EUA e o mundo.
Com efeito, a América de Palin é uma das grandes responsáveis pelo recrudescimento do antiamericanismo que tem caracterizado o mundo pós-11 de Setembro, pese embora esses sentimentos negativos face aos EUA já existissem durante o período da Guerra Fria e não tenham sofrido um acentuado decréscimo depois da queda do Muro de Berlim.
O aparecimento de Barack Obama foi, de facto, uma lufada de ar fresco. Não deixa de ser curioso, contudo, ver o regozijo de uma certa esquerda cínica e que, tendenciosamente, se coloca contra os EUA, ao lado daqueles que são antítese do mundo Ocidental. Dentro de portas defende-se a igualdade entre os sexos, a liberdade dos homossexuais, mas, paradoxalmente, são estas mesmas pessoas que fazem um exercício de “compreensão” sobre aqueles que, nos seus países, assassinam mulheres pelas razões mais prosaicas e perseguem homossexuais. Obama veio apaziguar, em parte, estas contradições, mas mesmo a sua eleição não vai sequer estar perto de eliminar o ódio que por aí prolifera.
Note-se que o antiamericanismo só será erradicado – digamos assim – quando a ordem internacional for alterada. O cenário mais provável é o do fim de uma única potência e a eclosão de um mundo multipolar – com potências como a Rússia, a China, a Índia, e provavelmente o Brasil. Dentro deste potencial grupo, dever-se-ia dar particular importância à Rússia e à China porque provavelmente serão estes os países a ditar essa nova ordem internacional. É claro que os EUA fazem parte desta equação, mas sem a preponderância de que têm vindo a gozar.
Um mundo em que a China e a Rússia ditem as regras, em parte com o equilíbrio dos EUA e da Índia, vai trazer saudades do mundo em que vivemos. Talvez muitos antiamericanistas venham, amanhã, a ser os mais saudosistas em relação a um mundo em que havia uma superpotência – aquela que, apesar das diferenças, das contradições e dos erros, partilha os nossos costumes, os nossos valores, o nosso modo de vida. Aquela que é uma democracia de facto.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...