Avançar para o conteúdo principal

Autenticidade e política

Há pouco mais de uma semana, a SIC presenteou os portugueses com duas entrevistas – uma ao primeiro-ministro e a outra a Luís Filipe Menezes – que mostram a vida mais privada dos políticos. É claro que a autenticidade ficou à porta das tais entrevistas – a artificialidade foi a pedra de toque das preciosidades televisivas em questão.
O primeiro-ministro, José Sócrates, optou por deixar a vida privada fora da entrevista, apostando mais numa estratégia de explorar a imagem construída para si. Por sua vez, Luís Filipe Menezes, fez o contrário – usou a família, colocando a tónica na parte mais privada da sua vida. O que, de facto, interessa saber é se estas entrevistas dão algum contributo positivo ou trazem algo de novo para a vida política do país e, claro está, para os portugueses. A resposta é nitidamente negativa, o que há é uma manifesta falta de autenticidade nas mesmas. Não são mais do que construções de imagens, levadas a cabo por agências de comunicação. São apenas momentos de artificialidade.
Mas o que torna tudo ainda mais caricato é a inépcia demonstrada por estes dois políticos na tentativa de dar alguma credibilidade ao espectáculo de vacuidade que deram aos portugueses.
No caso do primeiro-ministro, é visível a necessidade de ter tudo programado e estudado até ao último pormenor; não há espaço para improvisos o que torna tudo artificial, previsível, enfadonho. O primeiro-ministro afirma na entrevista que não é nenhum “autómato”, quando é precisamente essa a ideia que fica. Não esquecer também que quem só sabe viver na confortável previsibilidade, dá-se mal com o inesperado, revelando, amiúde, a sua verdadeira natureza.
O líder do principal partido da oposição prefere um ângulo ainda mais pessoal. Mostra-nos a sua casa e a sua família, chegamos mesmo a ver o líder do PSD a cortar o cabelo. Também esta entrevista não escapou à inanidade que caracteriza os dois políticos em questão. No caso de Menezes, consegue-se percepcionar com maior facilidade o trabalho da agência de comunicação. Na verdade, o político de plástico revela-se nesta entrevista de Menezes, em todo o seu esplendor.
De facto, as entrevistas que mostram a vida dos políticos, numa perspectiva de maior intimidade, revelam precisamente o contrário. A intimidade destes políticos é fictícia, é apenas uma construção, e, no caso de Menezes, uma péssima construção. O futuro da política em Portugal passará, muito provavelmente, por este tipo de momentos, até porque a instantaneidade que regula os dias de hoje coaduna-se na perfeição com a vacuidade desses momentos.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...