Esta frase, apesar de polémica, vai ser certamente proferida durante a cimeira Europa-África. Pode-se recorrer a uma multiplicidade de subterfúgios para justificar a presença do ditador Robert Mugabe na tal cimeira: a real politik, o facto da cimeira representar uma tentativa de diálogo entre a Europa e África (designadamente com países governados por corruptos e ditadores), o pragmatismo, enfim, tentar-se-á justificar a presença do tirano do Zimbabué de todas as formas e feitios, mas a presidência portuguesa da União Europeia não se livra do constrangimento, polémica e das dificuldades diplomáticas que vão caracterizar a cimeira.
Em primeiro lugar, importa referir que a presença de Mugabe nunca poderia ser consensual: Gordon Brown, primeiro-ministro britânico, já afirmou não se deslocar a Lisboa para a cimeira, do mesmo modo, Mugabe é um daqueles casos que semeia divisões entre os líderes europeus. O regime de Mugabe não prima pela originalidade, é mais um ditador de trazer por casa que provoca uma desgraça humanitária no seu país, além disso, o Zimbabué é um país cuja economia está arruinada, não há eleições livres e democráticas e a esperança média de vida é de 37 anos para os homens e de 34 para as mulheres. O regime de Robert Mugabe é responsável ainda por graves violações dos direitos humanos. A Europa não esquece tão-pouco as imagens de violência para com proprietários (brancos) de terras, o que originou a aplicação de sanções.
É este homem, por muitos considerado um libertador, que provavelmente vai marcar presença na cimeira Europa-África. Deste modo, é natural que muitas vozes se insurjam contra essa presença. Afinal de contas, a questão dos direitos humanos nem sempre é encarada com a seriedade necessária. Em rigor, vale o pragmatismo – a Europa necessita de estabelecer boas relações com Africa, ainda para mais quando países como a China começam a ter um peso avassalador no continente africano. Assim, nem se equacionou a possibilidade de não convidar Mugabe, enviando assim uma mensagem de que a Europa rege-se por princípios morais e que a sua política externa não se coaduna com as atrocidades que são cometidas no Zimbabué.
Ora, de que forma é que este convite é interpretado por outros regimes que mantém os seus países reféns do atraso, da violência e da corrupção? Ou que mensagem é enviada ao próprio Zimbabué? Refira-se que o convite de Mugabe serve também para agradar a outros líderes africanos da mesma estirpe do ditador do Zimbabué. Quem subscreve a decisão de convidar Mugabe alega que esta é uma excelente oportunidade de diálogo com o ditador. Esse argumento pouco valerá – não será a cimeira que vai mudar o regime – e serve apenas para escamotear a verdade.
A cimeira Europa-África envergonha os europeus. Ficamos, pois, a saber que a política externa europeia é condicionada por outros interesses. Se por uma lado já tínhamos percepcionado a subserviência patente na política externa portuguesa – a visita do Dalai Lama a Portugal foi paradigmática dessa subserviência disfarçada de real politik –, agora assistimos a uma Europa anódina e interesseira que aprecia criticar os EUA, mas que se esquece de olhar para si própria. Vai-nos valendo alguns líderes europeus que não compactuam com este circo denominado cimeira Europa-África. Entretanto, o Sr. Mugabe vem a Lisboa e sua presença será bem-vinda
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