Avançar para o conteúdo principal

E depois da DREN?

Será que o Governo saberá tirar uma lição do chamado caso DREN? Esta é a questão que se impõe após o arquivamento, por parte da ministra da Educação, do processo ao professor acusado de ter insultado o primeiro-ministro. Depois de tantas vozes se terem levantado em nome da liberdade de expressão e contra a delação, a ministra não tinha outra alternativa que não fosse encerrar o assunto através do arquivamento do processo. O trabalho ficou, porém, incompleto na medida em que a directora regional mantém-se no cargo e o delator saiu incólume desta situação.
Infelizmente, o Governo não percebeu, ou tardou a compreender, que a questão da DREN era muito mais do que um simples processo instaurado a um professor. O que sempre esteve em causa e continua a estar é a promoção acalentada pelo Governo de um clima em que a delação não é punida. Um clima que potencia o medo, por um lado, e a bajulação, por outro. Um clima que não se coaduna com os mais básicos princípios democráticos. Só o futuro dirá se o Governo saberá detectar e coarctar outros episódios com similitudes ao caso DREN.
Refira-se que as significativas alterações na administração pública e o recrudescimento da precariedade do emprego são factores que causam uma profunda insegurança, e que é neste quadro que os silêncios, a subserviência e o medo são fomentados. O Governo e alguns membros mais zelosos do PS deveriam ser os primeiros a insurgirem-se contra qualquer tipo de delação. Ao invés, o Governo promove o seguidismo mais primário. Deste modo, não se pode estar à espera de uma reforma profícua da administração pública quando os seus funcionários denunciam-se mutuamente e quando as chefias premeiam esses comportamentos insidiosos.
É curioso verificar como a ministra e alguns membros do PS procuram subterfúgios para encapotar os pontos essenciais de toda esta polémica. Procura-se, assim, enfatizar a questão dos alegados impropérios dirigidos ao primeiro-ministro, e relativiza-se a decisão da directora regional de Educação do Norte e do pérfido delator. Pode-se, pois, concluir que o Governo não aprendeu bem a lição. Em primeiro lugar porque refugiou-se em silêncios coniventes, e em segundo lugar, porque se absteve de tomar a decisão mais acertada: demitir a directora e punir o delator. Só assim se estaria a dar um sinal de que a delação não é aceitável num Estado democrático. Enfim, compreender-se-á que alguns políticos apreciem o estilo da directora e prefiram manter em funções quem lhes presta vassalagem. Ou não fosse este o país em que a “confiança política” serve para todas ocasiões.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Saídas para os impasses

As últimas semanas têm sido pródigas na divulgação de escândalos envolvendo o primeiro-ministro e as suas obrigações com a Segurança Social e com o Fisco. Percebe-se que os princípios éticos associados ao desempenho de funções políticas são absolutamente ignorados por quem está à frente dos destinos do país - não esquecer que o primeiro-ministro já havia sido deputado antes de se esquecer de pagar as contribuições à Segurança Social. A demissão está fora de questão até porque o afastamento do cargo implica, por parte do próprio, um conjunto de princípios que pessoas como Passos Coelho simplesmente não possuem. A oposição, a poucos meses de eleições, parece preferir que o primeiro-ministro coza em lume brando. E com tanta trapalhada insistimos em não discutir possíveis caminhos e saídas para os impasses com que o país se depara. Governo e oposição (sobretudo o Partido Socialista) agem como se não tivessem de possuir um único pensamento político. Assim, continuamos sem saber o que...

Fim do sigilo bancário

Tudo indica que o sigilo bancário vai ter um fim. O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda chegaram a um entendimento sobre a matéria em causa - o Bloco de Esquerda faz a proposta e o PS dá a sua aprovação para o levantamento do sigilo bancário. A iniciativa é louvável e coaduna-se com aquilo que o Bloco de Esquerda tem vindo a propor com o objectivo de se agilizar os mecanismos para um combate eficaz ao crime económico e ao crime de evasão fiscal. Este entendimento entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista também serve na perfeição os intentos do partido do Governo. Assim, o PS mostra a sua determinação no combate à corrupção e ao crime económico e, por outro lado, aproxima-se novamente do Bloco de Esquerda. Com efeito, a medida, apesar de ser tardia, é amplamente aplaudida e é vista como um passo certo no combate à corrupção, em particular quando a actualidade é fortemente marcada por suspeições e por casos de corrupção. De igual forma, as perspectivas do PS conseguir uma ma...

Outras verdades

 Ontem realizou-se o pior debate da história das presidenciais americanas. Trump, boçal, mentiroso, arrogante e malcriado, versus Biden que, apesar de ter garantido tudo fazer  para não cair na esparrela do seu adversário, acabou mesmo por cair, apelidando-o de mentiroso e palhaço.  Importa reconhecer a incomensurável dificuldade que qualquer ser humano sentiria se tivesse que debater com uma criança sem qualquer educação. Biden não foi excepção. Trump procurou impingir todo o género de mentiras, que aos ouvidos dos seus apoiante soam a outras verdades, verdades superiores à própria verdade. Trump mentiu profusamente, até sobre os seus pretensos apoios. O sheriff de Portland, por exemplo, já veio desmentir que alguma vez tivesse expressado apoio ao ainda Presidente americano. Diz-se por aí que Trump arrastou Biden para a lama. Eu tenho uma leitura diferente: Trump tem vindo a arrastar os EUA para lama. Os EUA, nestes árduos anos, tem vindo a perder influência e reputação ...