Primeiro levaram a qualidade do ar
Mas não me importei porque passava cada vez mais tempo dentro de casa
Depois ameaçaram de extinção um milhão de espécies
Mas não quis saber até porque não conseguiria enumerar duas ou três
Depois, e apesar de se saber que havia muita gente na terra, continuámos a procriar como se não houvesse amanhã
Mas não me importei porque na minha terra havia pouca gente
Não haverá amanhã?
Em seguida houve quem quisesse impingir a ideia que era preciso fazer muito mais,
No entanto não quis saber, eu que já tinha feito tanta reciclagem
Depois ameaçaram-me com o degelo, mas isso não afecta só os ursos polares?
Ainda me tentaram convencer que era urgente mudar de vida
Porém, mais facilidade tinha em imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo.
E depois senti o calor.
E depois fugi das águas que engoliam tudo no seu caminho.
E em seguida vi partes de cidades desaparecerem debaixo de água. Para sempre.
E agora os incêndios estão à minha porta, devoram tudo, e trazem consigo o dilacerante sentimento de impotência que não perdoa quem, como eu, nunca quis saber e, injustamente, quem quis saber, quem avisou e quem agiu.
Não haverá amanhã.
A partir da poesia de Bertold Brecht (Intertexto)
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